terça-feira, 10 de agosto de 2010

Sobre ser de esquerda ou de direita


Esse tema desperta paixões.

Procurando um artigo no Jornal de Londrina sobre basquete, encontrei um texto do Paulo Briguet, amigo jornalista aqui da terrinha. Conheci Briguet nos anos 90, ao visitar a república de um amigo, Marquinhos Diet. Na época fiquei espantado com o interesse pela intelectualidade que o então estudante de jornalismo trazia. E mais, Briguet era um trotskista convicto. Eu nada entendia de trotskismo, e o pouco que vinha lendo sobre marxismo e sobre o racionalismo crítico de Karl Popper me fazia cada vez mais um defensor do pensamento liberal.


Não é preciso dizer que alguém defender ideias liberais na universidade brasileira, particularmente nas ciências sociais era e continua sendo o mesmo que defender a importância de torcer para o Palmeiras para uma plateia dominada pela torcida do Corinthians. Eu já experimentava isso naquela época, e Briguet sabe o que isso significa hoje em dia.


No Brasil pouco se sabe sobre liberalismo ou mesmo sobre autores liberais. Como as teorias socialistas e pós-modernas ainda imperam na academia, ficamos todos sabendo da Escola de Frankfurt, da heróica crítica de Marx ao capitalismo, e conhecemos autores "bacanas" (porque socialistas) como Boaventura de Souza Santos e Habermas, por exemplo.

Raros são aqueles que conhecem as teses de um Hayek, ou de um Popper, ou mesmo de um Raymond Aron. Norberto Bobbio seria um dos reconhecidos, mais por seu Dicionário de Política e suas análises na Filosofia do Direito do que pela sua consistente defesa das ideias liberais. Muito poucos conhecem o debate diferenciando conservadores e liberais. Pouquíssimos sabem que um dia liberais estiveram ao lado dos socialistas, defendendo teses republicanas, como Murray Rothbard nos conta em seu "Esquerda e Direita".

Voltando ao Briguet. Dez anos mais tarde, eu com pouquíssimos e brancos cabelos, ele com uma testa crescente, nos reencontramos num shopping da cidade. Compartilhamos um café e recordamos seu passado trotskista.

Ele me contou que acabou abandonando as ideias socialistas ao se deparar com as críticas postas pelos autores da liberdade. Briguet foi objetivamente convencido pelas ideias, pelo debate franco e aberto que só a ciência e a filosofia podem oferecer. Isso só acontece àqueles que se apresentam diante do conhecimento com a coragem de por suas teses para serem testadas e, acima de tudo, de ter em mente que suas ideias podem estar equivocadas, e que a verdade pode estar em outra direção.

Comecei esse artigo dizendo que o tema acende paixões, pois é fato que o romantismo incensa as ideias socialistas e as reveste com aura de bom mocismo, de amor ao próximo e à humanidade, do mantra da igualdade, etc, etc, etc... É com o combustível do romantismo que os socialistas defendem teses como a da "transformação" da sociedade, da "revolução" (embora essa tese esteja um pouco fora de moda), e de "um outro mundo possível".



Socialistas adoram uma utopia.
O problema é que eles, insistentemente, negam-se a aprender as lições que a história cansou de pregar aos que saem matando gente em nome da igualdade e de uma bandeira utópica.

O hoje popstar Che Guevara disse um dia em pleno púlpito da ONU: "Em Cuba fuzilamos e continuaremos fuzilando". O amor cego pelo socialismo impede aos apaixonados de perceber que Che está, numa perspectiva realmente humanista, muito mais para vilão que para mocinho.

Em contrapartida os liberais, ao oferecer sustentação teórica ao capitalismo, seriam a antítese das românticas ideias socialistas. Estariam nessa corrente abrigados os interesses financeiros, a dureza do pensamento racional e focado na economia capitalista. Fora isso verdade e seríamos uns pobres coitados.

Ao contrário, a verdade repousa no compromisso que o liberal tem com o realismo e, não com uma ideia utópica de instalar o céu na terra, mas em corrigir da melhor maneira possível o que pode ser corrigido hoje, aqui e agora. E o que pode ser melhorado para o amanhã, sem que isso implique em tirar a vida de quem quer que seja, de impedir quem quer que seja de exercer seu direito de ir e vir, de se expressar, de empreender, de acreditar nos seus projetos de vida.

O que um liberal não quer é instalar a verdade por meio de decreto, como fazem os regimes totalitários. O que um liberal também não quer é calar a boca de seus oposicionistas via censura ou de uma comunicação de mão única, com a desculpa de ser "a comunicação das classes populares para as classes populares". Ele igualmente não acredita que seja possível sairmos de uma realidade imperfeita social e economicamente, para uma realidade justa e perfeita via "transformação", "revolução" ou "imposição popular". Para quem acha que isso é possível, sugiro ler o agradável clássico "A Revolução dos Bichos" de George Orwell. Com a linguagem de um conto de fadas, o autor nos mostra o horror em que se transforma uma ideia inicialmente romântica e bem intencionada de mudar o mundo via uma transformação utópica.

Paulo Briguet, ao se desvencilhar da paixão e da equivocada dicotomia direita/esquerda, abraçou o espírito honesto da investigação científica e da busca do conhecimento pelo conhecimento.
Como resultado teve seus olhos abertos, e bem abertos.

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